
As aspas já não me serviam mais
Nem que fossem as de Neruda
Era preciso “algo meu no mundo”
Não, acho que não passa por aí
Tinha muitos outros “algos” meus por aí
Tinham as experiências na cozinha
Tinha meu jeito único de descascar abacaxis
Meu jeito único de fazer cafuné
Tinha meu delicioso pudim de leite
Então o que faltava?
Boa pergunta. O que leva um sujeito a escrever tanto? O que leva um sujeito a perder tanto tempo em busca de versos perfeitos, da crônica irônica, do conto que foi parecendo que não ia e acabou indo? O que leva um sujeito a querer rimar lé com limão, a preferir uma página em branco a ver televisão?
Não, também não passa pela idéia do livro, do filho e da árvore. Meus escritos não ficarão para a posteridade, não serão best-sellers, nem perpetuaram minha espécie, quem dirá meu ponto de vista? Não quero vender minhas idéias, não me parecem suficientemente atraentes para serem vendidas.
Simples: escrito nenhum me bastava.
Escrevo porque cansei de me colocar entre aspas, me cansei do discurso colchinha de retalhos, pegando trechos de Drummond e Quintana, de Machado e Amado.
Cansei-me de ver aspas de falsos escritores tilintando nas minhas vistas. Fazendo troça de mim. Se eles vendem baboseiras porque não escrever as minhas próprias?
Cansei de ser a voz dos outros. Cansei de endossar, assinar embaixo, de fazer das palavras alheias as minhas próprias, cansei de plágio, de responder perguntas com frases dos outros sem ter que gastar um segundo e ter que pensar.
Foi isso. Simples assim, um dia resolvi pensar, comecei a escrever e nunca mais parei.